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segunda-feira, 18 de julho de 2011

Datafolha desvenda o mistério das multidões paulistanas

Datafolha desvenda o mistério das multidões paulistanas


Somos 4 milhões. É a maior do mundo!" Foi com esse grito que os organizadores da 15ª Parada Gay comemoraram, no chuvoso domingo de 26 de junho, a saída do último trio elétrico da rua da Consolação, no centro, ao final do evento. Na quinta-feira anterior, tinha sido a vez de os evangélicos festejarem sob sol forte na Marcha para Jesus, na pça. Campo de Bagatelle (zona norte). O saldo, segundo a organização, foi de 5 milhões de pessoas.
Para pôr fim à imprecisão e a esse antigo debate paulistano, o Datafolha calculou a quantidade máxima de pessoas que os três principais espaços a sediar eventos do tipo --avenida Paulista, praça Campo de Bagatelle e vale do Anhangabaú-- têm condição de abrigar. Mesmo com estimativas bastante generosas, é possível afirmar: não cabe tudo isso de gente.
Segundo o instituto de pesquisa, 1,5 milhão de pessoas é a lotação máxima do trecho Paulista-Consolação, caminho que a Parada Gay percorre. Isso num cálculo superestimado, considerando sete pessoas por metro quadrado, sufoco semelhante ao enfrentado por passageiros que embarcam na estação Sé do metrô no horário de pico. Para que 4 milhões ocupassem esses 216 mil m², seria necessário que 18 pessoas se espremessem em cada metro quadrado, algo só possível para contorcionistas como os da escola Acrobacia e Arte, convidados para ilustrar a capa desta edição.
Já os 5 milhões da Marcha para Jesus só seriam alcançados se 30 pessoas ocupassem cada metro quadrado do entorno da pça. Campo de Bagatelle e da avenida Santos Dumont, em Santana, cuja área total chega a 164 mil m². De acordo com o Datafolha, no máximo 1,15 milhão de pessoas podem ser reunidas ali.
Os organizadores argumentam que os eventos são itinerantes, duram mais de cinco horas e, por isso, recebem novos adeptos ao longo do dia. Mas, para especialistas, mesmo uma conta que contemple esse fluxo não resulta nos inflados milhões.
Se todos os espaços fossem preenchidos tanto na Paulista como na Consolação ao mesmo tempo, de calçada a calçada, 1,5 milhão de pessoas estariam grudadas umas às outras e praticamente imóveis durante a Parada Gay, segundo o Datafolha.
"Esses eventos mobilizam milhares de pessoas em temas de grande apelo político, econômico e ideológico. É claro que existe interesse de quem divulga em inflar os números", explica Alessandro Janoni, diretor de pesquisa do instituto. "Com essa medição, é provável que, nos próximos eventos, eles, sabendo que existe um limite, pensem duas vezes antes de divulgar."
O Datafolha usou como referência o manual de cálculo de multidões feito pelo Centro de Estudos e Pesquisas de Desastres (CEPD), da Prefeitura do Rio. Para chegar à lotação máxima desses espaços paulistanos, o instituto fez intencionalmente um cálculo superestimado. A área medida incluiu bancas de jornais, árvores, canteiros e outros espaços que não são ocupados. E também considerou que sete pessoas cabem em um metro quadrado, uma situação de confinamento que não acontece em eventos ao ar livre.
"Sete pessoas por metro quadrado são possíveis em áreas fechadas, como em um ônibus, onde os passageiros se empurram. Em áreas abertas, a aglomeração jamais passa de cinco por m²", explica o engenheiro Bruno Engert Rizzo, autor do manual do CEPD. Se essa regra fosse aplicada, o público nos eventos analisados pelo Datafolha seria ainda menor.
A reportagem da sãopaulo constatou que, durante as sete horas da Parada Gay, era possível caminhar tranquilamente nos dois sentidos da Paulista e da Consolação, o que reduziria a proporção a duas pessoas por metro quadrado em determinados pontos. "Quando o evento é aberto, há o que nós chamamos de ilhas de descompressão. As pessoas inevitavelmente se espalham", afirma Rizzo.
MAIOR DO MUNDO
O mistério das multidões paulistanas se agravou depois de 2007, quando a Polícia Militar deixou de divulgar suas estimativas para a Parada Gay. A corporação explica que o importante não é mostrar os dados, mas usá-los para calcular o efetivo de policiais necessários para os eventos futuros. Mas continua fazendo as suas contas.
Procurada pela reportagem, a PM revelou que, às 16h30, a Parada Gay tinha 1,1 milhão de participantes contados do Masp, ponto de início do desfile, até a rua da Consolação, na altura da praça Roosevelt.
O horário é, segundo o capitão Emerson Massera, o auge do evento. A PM tem um sistema que elabora os cálculos com base em imagens registradas por helicóptero e na avaliação de policiais. A conta é parecida com a do Datafolha, mas a aglomeração usada pela PM é a de seis pessoas por metro quadrado. "Na maior parte do evento, não se chegou a essa concentração", disse Massera, que cuidou do setor de estatísticas da PM por 12 anos.
Ser a maior Parada Gay do mundo sempre foi a meta dos organizadores. Em 2003, a versão paulistana era considerada a terceira colocada, atrás de São Francisco (EUA) e Toronto (Canadá), ambas com perto de 1 milhão. No ano seguinte, com estimado 1,5 milhão, o topo foi comemorado. Sete anos depois, a conta quase triplicou.
As estimativas de público infladas também são comuns em outros eventos na Paulista, como o Réveillon. Os organizadores da última edição apostaram em 2,5 milhões de pessoas. Mas a área de 135,5 mil m² da avenida suportaria 950 mil em sua aglomeração máxima, diz o Datafolha.
FLUXO HUMANO
Levando em conta o método usado pelo Datafolha, surge a pergunta: "Mas e a movimentação das pessoas que entram e saem?". Segundo os especialistas, o argumento de que o público é maior por se renovar ao longo de eventos de longa duração não se sustenta. De acordo com Rizzo, pesquisas de fluxo de pessoas por hora feitas no Rio mostram que o incremento máximo causado pela renovação de público seria de apenas 20%.
Ainda sobre deslocamento, nas contas do engenheiro Horácio Augusto Figueira, especialista em trânsito, seriam necessárias cerca de 26 horas para que 4 milhões passassem pela av. Paulista numa velocidade de caminhada lenta, a 1,8 km/h. No ritmo animado da Parada Gay, onde as pessoas fazem pausas para dançar junto com os trios elétricos, em sete horas passariam cerca de 1 milhão de pessoas --estimativa sem base científica, cujo resultado coincide com os números do Datafolha e da PM.
As divergências sobre o total de público de um evento não são exclusividade da Paulista, endereço mais famoso da cidade. Em Santana, na zona norte, a praça Campo de Bagatelle se tornou nas últimas duas décadas o palco predileto das festas de sindicalistas e evangélicos.
A Marcha para Jesus acontece simultaneamente em vários países. Em São Paulo, teve sua 19ª edição neste ano. Em 1994, quando ainda se chamava Marcha pela Paz e acontecia na av. Paulista, reuniu cerca de 500 mil pessoas, sempre segundo os organizadores. Para a PM, foram 20 mil.
Desde 2008 na Campo de Bagatelle, a festa religiosa dura cerca de nove horas. Ao fim da caminhada, que se inicia às 10h, shows com bandas de música gospel atraem o público jovem. Antes dos religiosos, eram os trabalhadores que celebravam por ali. O 1o de Maio era comemorado com shows e até sorteio de apartamentos.
PALCO HISTÓRICO
A polêmica em torno da quantidade de gente que uma manifestação reúne é antiga em São Paulo. Em 16 de abril de 1984, um protesto do movimento Diretas-Já, que reuniu lideranças da política, das artes e do futebol lotou o vale do Anhangabaú, mas não tanto quanto divulgaram seus organizadores.
Na época, foi dito que 1 milhão de participantes estiveram no evento para ouvir discursos de Ulisses Guimarães, Lula e Franco Montoro. Cálculo posterior do Datafolha mostrou que "apenas" 400 mil tinham participado.
Outro momento marcante da política nacional também teve o Anhangabaú como cenário. Em 18 de setembro de 1992, defensores do impeachment do então presidente Fernando Collor anunciaram que havia 1 milhão de manifestantes ali. A PM calculou na ocasião 650 mil pessoas. O Datafolha contou algo em torno de 70 mil.
Hoje o lugar é endereço certo de shows musicais e de telões que transmitem jogos da seleção brasileira durante as Copas do Mundo. No ano passado, a comemoração do centenário do Corinthians levou, segundo a PM, 110 mil torcedores ao local.
Agora sabe-se que, de acordo com o Datafolha, um evento no Anhangabaú pode receber quase 380 mil pessoas no máximo. Um tira-teima que, a exemplo dos exibidos na TV durante os jogos de futebol, veio para pôr fim às polêmicas que rondam as multidões paulistanas.
OUTRO LADO
A organização da Parada Gay afirma que está fazendo um estudo de público sobre o evento de junho, mas que ele ainda não foi concluído. Os números levam em conta a rotatividade e a quantidade de pessoas nas imediações da av. Paulista, segundo os organizadores.
"Nos inspiramos nos cálculos feitos pelo 'Guinness', com a estimativa de público em diferentes momentos da Parada", explica Leandro Rodrigues, assessor do evento.
A Igreja Renascer, que organiza a Marcha para Jesus, usa critérios semelhantes, mas admite que não dispõe de base científica. A exemplo da Parada Gay, afirma que o público é grande por causa da alta movimentação de gente em suas nove horas de duração. A igreja diz que ruas próximas ao palco da pça. Campo de Bagatelle também são ocupadas
Essa matéria publicado pela Folha e muito importante, pois põe em cheque essa historia toda de números que na realidade serve apenas para provocar uma competição entre grandes eventos. Isso ocorre entre eventos em São Paulo, e outras capitais como também vemos uma certa competição entre eventos semelhantes entre as principais capitais do Pais.
Um exemplo e o réveillon, antes somente a praia de Copa Cabana no Rio levava de 2 a dois milhões e meio de pessoas, ano passado  o evento na paulista levou dois milhões e meio. Ou seja, já esta se iniciando uma concorrência. Pelo menos agora, se neste ano o réveillon da paulista registrar mais de 3 milhões, já vai estar entendido como historia de pescador.
uanderson

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