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segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Máfia na Saúde fatura bônus sem trabalhar

Rio - Remédio para enfrentar o caos no atendimento dos hospitais federais do Rio, o APH (Auxílio de Plantão Hospitalar) saiu do Ministério da Saúde com a vocação de fixar médicos e enfermeiros nos plantões.

Um dinheirinho extra (R$ 850) capaz de manter o profissional por mais 12 horas semanais, além da escala de trabalho, cuidando dos pacientes de baixa renda. Medida espetacular não fosse o efeito colateral trazido pelo ‘jeitinho brasileiro’, que transformou o programa no autêntico bolsa-amigo ou ‘bocão’.

No Hospital Cardoso Fontes, em Jacarepaguá, o esquema consome por mês R$ 266 mil e não resolve o problema da falta de pessoal. Tanto que em várias semanas do mês de julho, a emergência não funcionou. Motivo: havia apenas um médico para atender os 21 pacientes internados. Quem chegava dava de cara com um cartaz lacônico na porta de entrada: “emergência fechada”.

A lista com os servidores escalados para os “plantões extra” traz profissionais de setores sem necessidade de extensão do horário, com múltiplas matrículas ou que tiram o extra durante o expediente normal. Resultado: a morte súbita do programa.
A campeã de benefícios é a enfermeira Eliete Lannes de Moura Oliveira. De segunda a sexta, ela se dedica ao serviço da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar — cargo burocrático que ajuda a direção a criar procedimentos e comprar material. Mas em todos os sábados e domingos, aparece na escala do APH.

Exato: trabalhou sem descanso nos últimos seis meses. Pelo menos no papel. Nos finais de semana, o servidor Antônio Carlos atende quem procura a enfermeira e, encabulado, recomenda: “É mais fácil encontrar a dra Eliete durante a semana”. Além do sumiço, ela não poderia fazer todos os plantões extras por exceder as 60 horas semanais estipuladas como teto pelo Ministério da Saúde. Somados salários e gordos “benefícios”, Eliete recebe R$ 15 mil por mês — R$ 6 mil de APHs.

Após denúncia do DIA , o Departamento de Gestão Hospitalar, responsável pela administração dos seis hospitais federais no Rio (Bonsucesso, Andaraí, Ipanema, Lagoa, Servidores do Estado e Cardoso Fontes), respondeu em nota que determinou a abertura de sindicância para averiguar possíveis irregularidades relacionadas ao cumprimento da jornada de trabalho e recebimento indevido de APH por servidores do Cardoso Fontes.

Responsável pela Enfermagem na emergência do Cardoso Fontes, Eugênia Lúcia Bomfim não cansa de acumular tarefas. Além da jornada de 40 horas semanais no hospital de Jacarepaguá, ela é aguardada no Posto de Saúde Manoel Athur Villaboim, em Paquetá, para jornada de 32 horas por semana.

Mesmo sem horário — afinal, em média tem carga de 10 horas de serviço por dia na semana inteira —, Eugênia ainda achou espaço para fazer cinco plantões mensais, entre dezembro e abril. O salário só com o hospital ultrapassa os R$ 14 mil por mês. O DGH diz que tem aberto Processos de Acúmulo de Cargo nas unidades federais.

A turma da Nutrição tem bom apetite na hora de abocanhar o APH. Apesar de contratadas para trabalhar 40h por semana, seis funcionárias se revezam em plantões extras de 12h durante o expediente. Três chamam a atenção por ultrapassar o teto de 60h semanais estabelecidos pelo Ministério da Saúde. Resumindo: não poderiam fazer o bico. Juntas, em julho, receberão R$ 27 mil extras.

A médica Denise Maria Negreiros Carrancho tem carga de 40h semanais no Cardoso Fontes e trabalha quatro vezes por semana no Centro Municipal de Saúde Milton Fontes Maragão, além de estar às segundas no Adão Pereira Nunes. São 82h de trabalho por semana. E teve fôlego para cinco plantões extras na Pediatria, em junho, e quatro planejados para este mês. Só no papel: pelo menos dois dos extras coincidiam com trabalho no posto de saúde municipal.

Assídua na gratificações nos últimos três meses, a enfermeira Patrícia da Silva Olario divide seu tempo entre o Hospital Cardoso Fontes — onde de segunda a sexta coordena o Serviço de Atendimento Domiciliar —, duas aulas semanais que ministra em cursos e faculdades e os plantões extras — cinco em média por mês.

Juntos, os trabalhos extrapolam o teto estabelecido pelo Ministério da Saúde de 60 horas. E vai ficar mais apertado ainda: no próximo mês, Patrícia retorna de licença à Maternidade Fernandes Figueira, do município do Rio, onde terá mais 32 horas de serviço.

Quem também está acima do teto é a enfermeira Elisabeth Baptista da Cunha. Como acumula as 40h do Cardoso Fontes, com 24h no Hospital Estadual Carlos Chagas, mas nada que retire seus quatro ou cinco APHs por mês. Geralmente de madrugada. Mas tem mordomia: quase sempre o serviço é executado na supervisão ou no acolhimento, onde há sala espaçosa com cama, TV e ar condicionado.

Exemplo de benefício conquistado pela enfermeira Marta Moura de Oliveira Meirelles. Além do hospital de Jacarepaguá, ela tem contrato de 40h com o Into, o que praticamente a consome todos os dias. Mesmo assim, abiscoitou, nos últimos seis meses, auxílios extras no plantão noturno. Também no acolhimento ou na supervisão.

Os envolvidos no esquema

ELIETE LANNES
Chefe do CCIH, além de trabalhar de segunda a sexta, dá plantão nos sábados e domingos. Extrapola o teto de 60 horas semanais previsto para os servidores da União. Pela escala, nunca descansa.

PATRÍCIA OLARIO
Trabalha de segunda a sexta no Atendimento Domiciliar e ainda faz plantões em outro hospital do município. É escalada em plantões extras durante o expediente. Dá aulas em cursos e faculdades.

MARTA MEIRELLES
Trabalha em dois hospitais federais e suas atividades de rotina já ultrapassam o teto de 60 horas. Mesmo assim, aparece escalada em plantões extras no Cardoso Fontes entre janeiro e maio.

SILVANIA MONDEGO
Tem contrato de 40 horas com o Cardoso Fontes e, até recentemente, chefiava a enfermagem no Hospital Pateur, no Méier. Aparece nas escalas de APHs ao longo dos últimos seis meses.

ETIENE PICANÇO
Seu contrato é de 40 horas e realiza plantões de APH mais de uma vez por semana, o que estoura o limite de 60 horas. A Nutição faz um rodízio de extras entre seis servidores do Cardoso Fontes.

ELISABETH BAPTISTA
Enfermeira no Cardoso Fontes e no Carlos Chagas. Sua carga de trabalho é de 64 horas — acima das 60 horas permitidas. Apesar disso, ainda aparece como beneficiada com APHs toda semana.

EUGÊNIA BOMBIM
Chefia a Enfermagem no Cardoso Fontes e também trabalha em posto de Paquetá. Sua jornada chega a 72 horas semanais. Nada que a impedisse de aparecer em extras durante o plantão noturno.

ELIANE TERRAZAS
Contratada para trabalhar 40 horas, como todos os funcionários lotados na Farmácia, realiza em média de quatro a cinco plantões de APH durante a semana, durante a escala regular de serviço.

DENISE CARRANCHO
É a médica com a maior média de horas trabalhadas. Tem duas matrículas no Cardoso Fontes, uma no estado e outra no município. Seus horários de rotina coincidem com os plantões de APH.

VANESSA PACHECO
O pessoal da Nutrição faz 40 horas por semana, de segunda a sexta-feira, e faz rodízio dos APHs. Em média, realiza dois e estoura o teto de 60 horas determinados pelo Ministério da Saúde.

Fonte: Jornal O Dia Online


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